11/02/1987: Cruzeiro 1x1 Atlético MG

quarta-feira, 11 de fevereiro de 1987



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Ficha do jogo
Entrevistas antes dos jogos das quartas de finais
Reportagem Globo.com
Reportagem sobre a expectativa para o segundo jogo



Do globoesporte.com
Atlético-MG e Cruzeiro iniciam, nesta quinta-feira, a busca por uma vaga na semifinal da Copa do Brasil. Será mais um confronto com a rivalidade histórica como pano de fundo, com direito a treinos fechados, mistério dos treinadores, elencos blindados do assédio de jornalistas e torcedores, entrevistas coletivas com jogadores escolhidos pela assessoria de imprensa, declarações cuidadosas dos atletas para evitar motivação extra ao adversário, jogos em modernas arenas, cada clube com "seu estádio" e sem torcida meio a meio. Mas como era tudo isso no primeiro mata-mata nacional disputado entre Atlético-MG e Cruzeiro, em fevereiro de 1987?
Em 32 anos, muita coisa aconteceu - inclusive outros dois mata-matas nacionais entre os rivais (1999, pelas quartas de final do Brasileiro, e 2014, na decisão da Copa do Brasil). De 1987 pra cá, muita coisa mudou. A começar pelos locais de treinamento. Se hoje Atlético e Cruzeiro fazem as atividades nas superestruturadas Cidade do Galo e Toca da Raposa II, respectivamente, na década de 80 os trabalhos eram na Vila Olímpica e na Toca da Raposa I.

Uma atmosfera totalmente diferente também. Treino fechado? Coletiva? Que nada! Imagine você que o técnico concedia entrevista dentro do campo. Podia ser antes ou depois da atividade com os atletas.
Ílton Chaves, comandante do Atlético na época, tendo ao fundo os vestiários e a movimentação da Vila Olímpica - também clube de lazer do Galo -, analisava a equipe na véspera do duelo:

- A escalação está dependendo do Renato, a escalação dos 11, de uma palavra do médico para que eu defina nossa equipe para o compromisso dificílimo e importante contra o Cruzeiro.

Se a dúvida era Renato Morungaba, então, por que não ir direto a ele e perguntar como se sentia? O problema era que Renato estava em tratamento no departamento médico. Sem chances hoje em dia. Não em 1987. Naquele ano, a reportagem foi até a sala do departamento médico e entrevistou o meia. Ele estava deitado na maca sendo examinado.

- Bom, vontade não falta (de jogar). O Neylor (Lasmar, médico) não pôde comparecer hoje na Vila Olímpica. O teste final vai ser amanhã - disse Renato.


Em caso de veto a Renato, o atacante Ramon seria o escolhido para formar a linha de frente com Sérgio Araújo e Edivaldo no Atlético. Naquela mesma Vila Olímpica, Ramon, sem camisa e após apreciar um picolé, falava com o jornalista sobre o jogo. Ele era o terceiro entrevistado do dia, no terceiro local diferente. Ao fundo, sócios do clube, de roupa de banho, caminham rumo à piscina.

- Espero poder participar de mais um jogo e mais um clássico - disse Ramon.
Em outro momento da preparação alvinegra, o volante Elzo faz tratamento no joelho, usando uma cadeira como suporte, em um dos corredores de acesso à área interna da Vila Olímpica.
Na Toca da Raposa, o protocolo não era muito diferente. O volante Ademir mal tinha acabado de treinar e, ainda em campo, concedia entrevista, falando sobre o jogo de volta. Exausto após a atividade, não teve como esconder a voz ofegante.

- Praticamente, é o maior clássico regional, no momento, no Brasil. Vamos enfrentar uma equipe muito boa, que é séria candidata ao título, mas o Cruzeiro tem todas as condições, já mostrou isso domingo, de ganhar do Atlético - ressaltou.
Quase 100 mil e torcida dividida
A expectativa para a partida era gigante, assim como este ano, quando os clubes esperam lotar Mineirão, mando do Cruzeiro, e Independência, mando do Atlético. Porém, somadas as lotações dos atuais estádios de Belo Horizonte - pouco mais de 85 mil -, o número ainda será inferior ao público registrado em apenas um dos jogos de 1987. Quase 200 mil ingressos foram vendidos. O primeiro clássico recebeu 94.381 pessoas. No segundo, 90.190. Ambos os jogos no Mineirão.

Era um "velho" Mineirão... Com torcida dividida, arquibancada de cimento, geral abarrotada de gente, bandeiras e faixas pelo estádio. Nada de celulares. Na mão, ou melhor, colado no ouvido, estava o antigo rádio de pilha.
m fevereiro de 1987, os ingressos custavam 10 Cruzados (geral), 50 Cruzados (arquibancada) e 150 Cruzados (cadeira). O salário mínimo na época era de 964,80 Cruzados. As rendas das partidas foram aproximadamente 4 milhões de Cruzados, cada. Para o clássico desta quinta-feira, as entradas variam de R$ 60 a R$ 150.

Os times
Em campo, o Atlético tinha: Pereira; Nelinho, Luizinho, Batista e Paulo Roberto; Elzo, Éverton e Zenon; Sérgio Araújo, Renato e Edivaldo.

Uma curiosidade: Nelinho estava prestes a encerrar a carreira. O lateral-direito acabara de se eleger deputado estadual, mas, antes de defender os interesses públicos na Assembleia, foi a campo lutar pela vaga às semifinais do Brasileiro.

Pelo lado do Cruzeiro, o técnico Carlos Alberto Silva tinha: Gomes; Balu, Geraldão, Gilmar Francisco e Genílson, Douglas, Ernani e Heriberto; Eduardo II, Hamilton e Edson.
Os confrontos
"Imagina um Atlético e Cruzeiro valendo vaga na semifinal de Brasileiro? Sabíamos da importância de ganhar"
As palavras são de Renato Morungaba, hoje, aos 62 anos, treinador do sub-17 do Guarani, de Campinas. Em entrevista ao GloboEsporte.com, ele relembrou os clássicos daquele ano. Para ele, a disputa foi especial. Após um ano ruim pelo Botafogo, o meia se reencontrou com a camisa do Galo.

- Eu me recuperei no Atlético, após um ano não tão bom no Botafogo. Voltei a jogar tudo que joguei no Guarani, São Paulo e Seleção.

epois de 28 partidas, entre primeira fase, segunda fase e oitavas de final, o destino colocou os rivais mineiros nas quartas de final do Campeonato Brasileiro de 1986 - as fases finais foram disputadas no começo de 1987.

O Atlético avançou à segunda fase como 1º do Grupo D. Depois, como 1º do Grupo L, assegurou vaga nas oitavas, eliminando o Flamengo. O Cruzeiro se classificou, na primeira fase, como 5º do Grupo C. E chegou às oitavas como 1º do Grupo K. Após passar pelo Joinville, a Raposa tinha o Galo pela frente.

No primeiro jogo, dia 8 de fevereiro de 1987, um domingo à tarde, o grande nome da partida foi o goleiro Gomes, do Cruzeiro. Com grandes defesas, evitou que o 0 a 0 do placar fosse modificado nos primeiros 90 minutos do confronto. Gomes foi eleito o goleiro do "Fantástico" naquele dia.
O "centroavante" e o alvo da rivalidade
O duelo decisivo aconteceu na quarta-feira seguinte, dia 11 de fevereiro, à noite. E, desta vez, houve bola na rede. No segundo tempo, ao sete minutos, Sérgio Araújo pegou a sobra e tocou para Renato. Na saída do goleiro, ele abriu o placar. Renato jogou mais avançado naquele jogo. O Galo não tinha mais Nunes em campo, já que o centroavante durante as primeiras fases do Brasileiro, ficou sem contrato no fim de 1986.

- Durante o campeonato, em 1986, eu joguei mais pelo lado esquerdo. As fases finais foram no começo de 1987. O Nunes já tinha ido embora. Todo o grupo pediu para o Nunes renovar por um, dois meses. Ele era o nosso artilheiro. Mas não teve jeito. Eu, então, joguei mais centralizado. E fiz um gol de centroavante, após uma jogada que Sérgio Araújo ganhou no meio-campo. Ele tocou na entrada da pequena área, eu bati meio prensado e a bola passou por cima do goleiro - recorda Renato.

Renato festeja o gol nas quartas de final do Brasileiro de 1986 — Foto: Reprodução/TV Globo
A reação do Cruzeiro foi imediata. Aos 13 minutos, Douglas, após receber de Hamilton, deixou tudo igual. Justo Douglas, o volante que, segundo ele mesmo conta, era alvo da rivalidade dos jogadores e da torcida do Atlético.

"A maior rivalidade do time e da torcida do Atlético, naquela época, era comigo, não sei se as pessoas se recordam. Eu pegava a bola, a torcida do Atlético gritava: 'É esse, é esse!'. Criaram essa rivalidade"
- A torcida achava que eu entrava mais duro, mas não era isso. O time do Atlético era muito bom. A gente precisava dar uma igualada, nem que fosse fisicamente. Eu fiquei muito amigo do Luizinho (zagueiro do Galo), e ele conta que, no vestiário, os jogadores falavam: “Vamos pegar aquele lourinho. Não vamos deixar ele mandar no jogo”. Na rua, a torcida falava que queria me matar (risos) - relembra Douglas, com bom humor, ao GloboEsporte.com.
s times perderam chances para marcar o segundo gol. O Atlético, uma clara com Everton. O Cruzeiro lamentou duas bolas na trave. E era mesmo para lamentar. O empate classificou o Galo, dono de melhor campanha nas fases anteriores.

- Atlético e Cruzeiro sempre vai ser Atlético e Cruzeiro, independentemente de quem está melhor ou pior. Sempre tem equilíbrio. A gente pressionou no final, tivemos bola na trave. Aí, não fica tão pesada uma desclassificação, porque o time lutou - destaca Douglas, hoje com 56 anos e morador de Bambuí, no Centro-Oeste de Minas, onde é empresário do ramo de frigoríficos e suinocultura.

Arbitragens de final de Copa
Os donos do apito nos jogos foram Arnaldo César Coelho, no duelo de ida, e Romualdo Arpi Filho, na volta, justamente os dois árbitros das duas últimas finais de Copa do Mundo disputadas até então. Arnaldo conduziu a decisão de 1982 - Itália 3 x 1 Alemanha. Romualdo, a de 1986 - Argentina 3 x 2 Alemanha.

Rivalidade viva
Agora, 32 anos depois, um novo mata-mata nacional fará Atlético e Cruzeiro medirem força. O primeiro capítulo é nesta quinta-feira, no Mineirão. O jogo decisivo é na quarta-feira da semana que vem, no Independência. O momento no futebol é outro. O acesso aos jogadores, as entrevistas, os treinos, os personagens... Tudo mudou. Mas a rivalidade segue pulsando firme.